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O que, de fato, é a Matrix?

Atualizado: 9 de mar. de 2023


Conversando com um amigo meu, disse-me ele, como um Cypher, que quer aproveitar das benesses da Matrix. Esse bife não existe, mas... é delicioso! O que significa estar na Matrix sem ser da Matrix? Melhor ainda, o que é a Matrix? Os estudiosos nos dizem que devemos transcender o véu de Maya – a Ilusão – e desprezar todos os bens materiais. Mas o meu amigo quer chegar de Porsche a um restaurante cinco estrelas de Nova Iorque, com uma loiraça a seu lado, e pedir o melhor prato do chef, empanzinar-se e depois comer a loiraça de sobremesa. Que problema há nisso, se há algum?


Esses estudiosos costumam ser moralistas e estar mais preocupados em tirar a humanidade do seu estado animal do que em elevá-la a seu estado divino. Então não devemos lhes dar tanta bola, se não queremos ficar preocupados demais com a nossa conduta. Tenho inclusive dúvidas sobre se o ser humano deve desprezar seu estado animal ou antes assumi-lo como sua parte integrante. Talvez seja melhor olhar-se tal como se é, sem recriminações, em lugar de criar uma autoimagem pseudodivina. Afinal, todos nós amamos, comemos e cagamos como os animais, com a diferença que colocamos vaidade nisso.


Mas voltemos ao nosso assunto: o que de fato é a Matrix? Certamente não é um lugar, porque ela é onipresente. Também não é uma simulação de computador, porque a Matrix do filme é apenas uma metáfora para a Matrix real. Na verdade, a Matrix é uma forma de enxergar o mundo – é um paradigma.


Eu gosto de pensar que há diversas instâncias da Matrix – a do estatismo, segundo a qual a sociedade precisa de um Estado; a do casamento, segundo a qual é preciso casar-se; a do trabalho, segundo a qual o homem precisa trabalhar; a da religião e muitas outras. Nesse aspecto, Matrix significaria ilusão, do que estamos abundantemente rodeados – crenças ou programas mentais que estão rodando em segundo plano e que uma investigação mais aprofundada demonstraria falsos.


Mas nenhuma dessas era a Matrix à que meu amigo se referia. Creio, sem ter-lhe perguntado, que ele se referia ao gosto pelos prazeres materiais. E até ele está iludido aqui, acreditando que sair da Matrix significa abandonar os prazeres. Essa visão resulta de uma crença de acordo com a qual há algo de negativo no gozo da matéria. Trata-se de uma visão dual, bipartida e esquizofrênica de mundo. Se houvesse algo de errado nos bens materiais, Deus não os teria criado.


A única coisa que há de errado é o modo como o homem desfruta desses prazeres, que o leva à ruína. Quando um homem é abandonado pela mulher por quem se apaixonou, amaldiçoa todo o sexo feminino; quando cai no desespero das drogas, quer proibi-las; quando com nojo assiste à ganância, condena a fortuna. Nunca é ele o culpado – mas sempre o mundo externo.


Daí chegamos à nossa Matrix de todas as Matrix: a crença na existência de um mundo externo e separado.


“Sua fé mais irremovível...”, diz Dreamer, personagem de Elio D’Anna em A Escola dos Deuses, “sua convicção mais nociva é acreditar que existe um mundo externo a você, alguém ou alguma coisa de quem depender, alguém ou alguma coisa que possa lhe dar algo... ou tirar-lhe algo, escolhê-lo ou condená-lo”.


E em Eu sou aquilo, o mestre Nisargattada Maharaj assim responde a um buscador que o inquire: “Você está cometendo um único erro: você toma o interno pelo externo e o externo pelo interno. O que está em você, você pensa que está fora, e o que está fora, você pensa que está em você. A mente e os sentimentos são externos, mas você pensa que eles são íntimos. Você acredita que o mundo é objetivo, quando ele é totalmente uma projeção da sua psique. Essa é a confusão básica, e nenhuma nova explosão virá para corrigi-la. Você tem que sair dela usando o pensamento. Não há outra saída.”


A ilusão última é acreditar que o mundo externo tem realidade objetiva e separada da consciência. Filosoficamente, creio que essa tese possa ser provada de maneira indubitável, mas não me preparei para fazê-lo aqui. Posso arriscar, no entanto, uma prova simples baseada em duas premissas. Primeira: que só há uma substância. Segunda: que a única coisa da qual temos certeza e experiência direta é a consciência. Logo, a consciência é a substância. Se isso é verdade, nada está fora de mim, e nem mesmo dentro de mim, mas eu permeio tudo.


Disso resulta que a realidade interna condiciona a externa, e não o contrário. “Você não se sente assim porque as coisas estão assim”, diz Neville Goddard, “mas as coisas estão assim porque você se sente assim”. O entendimento dessa verdade nos dá o poder de modificar a realidade a bel-prazer. Regra e exceção se torna uma distinção supérflua, pois só existem regras individuais. O que chamamos de caso excepcional é apenas o resultado de uma fé maior. Quem nunca viu um milagre ou algo extremamente improvável acontecer? A única coisa impossível é aquilo que não se consegue imaginar.


Retornemos agora ao caso do meu amigo: ele não quer abrir mão dos prazeres. E quem disse que isso é necessário? O que os gurus ensinam, se bem compreendido, é o desapego interior, e não uma rejeição meramente externa. Por isso que é fútil o esforço do buscador que apenas vai embora da cidade levando consigo todos os apegos, achando que eles vão desvanecer como uma poça sob o sol. Na verdade, uma forte recusa de algo, chegando ao ponto da abominação, é na maioria das vezes expressão do mais intenso desejo por aquilo. De outro lado, entregar-se a um prazer não significa necessariamente estar apegado a ele. E não estar apegado, por incrível que pareça, torna-o ainda mais prazeroso.


Não há necessidade nenhuma de abandonar a vida comum para atingir graus mais elevados de consciência. Mas há aqui dois fatos importantes para serem levados em consideração. Primeiro, que as obrigações da vida cotidiana podem sim atrapalhar a busca espiritual, já que são distrações que não levam a lugar nenhum. Segundo, que, quando o indivíduo consegue manter um certo distanciamento dos fatos, estes, ao invés de distraí-lo, aceleram o seu desenvolvimento, pois no atrito dos eventos conseguimos enxergar melhor alguns vícios do ego. Isso, porém, não reduz em nada a importância de momentos de solidão nessa busca.


Portanto, não há absolutamente nada de errado nos prazeres materiais, nem é preciso ser da Matrix para desfrutá-los. Sucede que os que vivem na Matrix colocam todo o seu foco nesses prazeres, achando que neles encontrarão a felicidade. E assim passam a vida inteira correndo atrás do próprio rabo.



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