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Foto do escritorBruno Buback

O Brasil pode mesmo se tornar uma Venezuela?

Atualizado: 9 de mar. de 2023


Martín Tovar, "La Firma del Acta de Independencia", 1883.

No último pleito eleitoral surgiu o medo de que a vitória do candidato de esquerda conduzisse o país a um sistema político-econômico semelhante ao estabelecido na Venezuela. Vários alunos me procuraram para fazer a pergunta do título.


O país latino situado no mar do Caribe, entre os anos 50 e 80, foi uma das maiores economias das Américas, tendo sido apelidado de “Venezuela Saudita”. Com a maior reserva de petróleo do mundo, nada poderia deter a revolução bolivariana que seguiu nas últimas décadas. No entanto, a crise sem precedentes como resultado das políticas econômicas venezuelanas já poderia ter sido prevista pelos economistas, bastava aprender um pouco de ciência econômica. Mas os socialistas não conhecem essa ciência. Caso conhecessem, não seriam socialistas.


Vejamos: a Venezuela virou a Venezuela. Então, o Brasil tem plenas condições de se afundar em uma grande crise, em uma nova onda de hiperinflação e com o comprometimento crônico das liberdades civis, individuais e econômicas. Só é preciso dar tempo suficiente para que os sábios governantes de esquerda implementem o socialismo que nunca deu certo, mas que eles, com sua sabedoria divina, sabem como deve ser feito. E se não souberem? Bom, aí é culpa do capitalismo.


“Mas nossa democracia é vibrante e nossas instituições funcionam, se alguma crise aparecer”, bradam os mais confiantes. “Se as coisas saírem dos trilhos, poderemos eleger um novo presidente ou até fazer impeachment de quem estiver no comando”, reverberam os moderados. Ora ora, a Venezuela também já foi um sistema democrático, mas, nas contas de hoje, pelo menos 25% da população bateu em retirada do país, diante da incapacidade de mudança por vias democráticas.


Ao que vemos hoje do Brasil, nobre confiante ingênuo, se uma crise se instalar, poderemos ir às urnas ou às ruas para retomar o caminho do progresso. Mas quando a esquerda se enraizar no poder não será fácil remover o câncer e sua metástase.


O que nos resta, como brasileiros, é entender o processo de enraizamento da esquerda, para que nossas instituições e o povo (ainda) possam resistir e se defender quando a crise chegar.


Para se perpetuar no poder, os partidos de esquerda precisam adotar algumas estratégias, que podemos simplificar nos seguintes elementos, que não seguem uma ordem de preferência.


1. Assumir o poder.


2. Aparelhar o judiciário. Na maioria dos sistemas jurídicos do mundo, o Judiciário está incumbido de dar a última palavra sobre os conflitos da sociedade. Isso inclui os conflitos com o próprio governo. Seja para impedir o avanço da pauta antiesquerda ou para promover a pauta socialista, a concordância do Poder Judiciário é imprescindível para sustentar um governo de esquerda por décadas.


Como? Depois de assumir o poder, os novos governantes de esquerda poderão nomear os ministros dos tribunais superiores de todo o país. No início isso acontece com o tempo, com as aposentadorias. Se o governante estiver à vontade e com apoio de outros setores – como a mídia, o povo e as forças armadas –, pode acelerar o processo destituindo juízes de oposição. As universidades fazem um papel indireto, formando a base esquerdista que ingressará nas carreiras da magistratura, do serviço público em geral e nos Conselhos de Classe, especialmente a dos advogados.


3. Aparelhar o Parlamento. O Congresso Nacional fiscaliza o executivo e edita as leis. Parlamentares de oposição atuantes podem colocar tudo a perder. Manifestações e revoltas precoces dificultariam o enraizamento. Principalmente no início, é imprescindível que o regime tenha o aspecto de democracia, como se a vontade do povo pudesse ser ouvida. De outro lado, parlamentares de esquerda, no ápice do movimento, pautam e editam uma nova Constituição Socialista capaz de agravar todos os quesitos de enraizamento.


Como? Primeiramente, pelo voto. Pode ser o voto legítimo ou comprado ou mesmo fraudado na apuração das urnas. O voto legítimo é conquistado pelos adeptos da esquerda depois de anos de doutrinação escolar. Cidadãos de todas as classes interessados em alguma política específica do governo costumam depositar seu voto em legisladores de esquerda. Na outra ponta, uma população pobre e dependente acredita que a única salvação é mais Estado, seja pelas promessas encantadoras do socialismo ou mesmo por aceitar a compra de votos. No mais, com o Congresso eleito, ainda restarão alternativas mais ousadas, seja comprando parlamentares ou destituindo “golpistas” opositores ou mesmo silenciando os que persistirem.


4. Aparelhar a mídia. Os meios de comunicação conduzem a opinião pública. Podem legitimar políticas ou candidatos, desonrar parlamentares, reviver tensões e estabelecer o medo. E tudo isso pode servir para promover as pautas da esquerda ou desacreditá-las.


Como? Restringindo concessões de novos canais de TV e rádio. Por meio do financiamento de artistas, intelectuais, páginas na web e emissoras comprometidas com a pauta. No estágio mais avançado de tecnologia, com a informação descentralizada e distribuída nas redes sociais, são sugeridas leis para regular e restringir o acesso a determinados conteúdos. O combate às fake news e rotulações desonrosas ajudam na aceitabilidade da população em favor da censura e controle dos meios de comunicação. Mais adiante, são suspensas e cassadas contas e perfis não alinhados com a pauta. No passo mais avançado, pessoas podem ser perseguidas por crime de opinião, sob justificativas como “atos antidemocráticos”, “abuso da liberdade de expressão”, “desinformação” ou “desordem informacional”. Leis, decretos e julgamentos dos tribunais validam o cerceamento à liberdade de expressão e imprensa.


5. Aparelhar as forças armadas. Uma vez que se estoura uma crise econômica, a população faminta sai às ruas exigindo a troca de governantes e da política econômica desastrosa. O povo nas ruas é o que qualquer político teme. O desarmamento da população faz parte desse quesito.


Como? Pelo processo natural, promovendo e nomeando novos membros para as posições importantes. Vale aposentar precocemente os antigos com as altas patentes, nomeando novos comprometidos com a causa. Para acelerar esse processo, basta destituir ou mesmo prender “golpistas” opositores por crimes de opinião ou atos antidemocráticos, mesmo que não exista um tipo penal para tanto.


6. Adesão do povo. Um povo dependente, faminto ou amedrontado pela violência sempre quer mais Estado. Não tem tempo sequer para pensar, quiçá para lutar por liberdade. Principalmente no início, as comoções populares devem ser evitadas, sob pena de uma resposta rápida das instituições que ainda não estão adequadamente aparelhadas. Parte da população precisa concordar com o governo de esquerda, uma outra parte precisa depender do governo de esquerda. O restante que não concorda precisa estar incapacitado de reagir, pelas ideias ou pela força.


Como? Colocar a maior quantidade de pessoas em situação de dependência (preferencialmente acima de 50%), financiando prodigamente benefícios sociais. Ou seja, tornando a vida delas melhor com a impressão de moeda, pelo menos até a fatura do cartão chegar. Em seguida, quando a inflação se alastrar em decorrência da política econômica desastrosa e quando o mercado estiver comprimido e burocrático, quase ninguém conseguirá mais ascender economicamente.


7. A Solução Final. Quando a economia implodir, intensifique o desastre: promova o controle de preços, financie e subsidie os amigos do rei, imprima mais moeda para cobrir os rombos e manter a população apática. Com o aumento generalizado de preços (inflação), atribua culpa aos empresários gananciosos, ao capitalismo e ao imperialismo. E agora? Dobre a aposta! Retome o ciclo: controle de preços, amigos do rei, impressão de moeda, etc. A população – totalmente crente nos discursos do governo e altamente dependente – irá sempre pedir por mais intervenção do governo, nunca menos, ainda que todo o problema tenha sido causado pelo próprio Estado. As escolas, os sindicatos, a mídia e os intelectuais mantêm o controle das ideias. Quando a revolta social entrar em erupção, as forças armadas aparelhadas entram em ação para frear movimentos “golpistas” da pouca população que se dispõe a arriscar a vida por liberdade. Pessoas desarmadas nas ruas são reprimidas violentamente. Fim.


Reeleja-se eternamente.


Fique à vontade para ler os itens acima e estudar a história da Venezuela. Vai encaixar como uma luva. Agora, passe a ler os itens acima e verificar a história da Argentina e do Brasil, principalmente neste século. Cada um no seu tempo, mas não na mesma ordem, segue o caminho do fracasso socialista.


O Brasil, ainda, teve um momento de lampejo, com alguns erros de percurso da esquerda. Primeiro, a compra de parlamentares foi denunciada por alguém de dentro do esquema. O Mensalão escancarou o aparelhamento espúrio do parlamento. Segundo, a Operação Lava Jato e seus membros obstinados atravancaram o processo de enraizamento, expondo as entranhas do sistema. O escândalo do Mensalão estourou em 2005 e, mesmo assim, Lula foi reeleito em 2006. A Operação Lava Jato foi deflagrada em março de 2014 e, mesmo assim, Dilma foi eleita em outubro daquele ano.


Dilma sofreu o impeachment em 2016. No pleito eleitoral seguinte, em abril de 2018, Lula foi condenado por várias instâncias e preso. Como as instituições não estavam totalmente aparelhadas e o povo ocupava as ruas, a esquerda alocada nas instituições não tinha muito o que fazer. Ainda não.


Se tivéssemos uma mídia social regulada e as forças armadas enviesadas à esquerda certamente seriam sufocadas as manifestações “golpistas” de 2015 a ponto de evitar o impeachment de Dilma. Em suma, não deu tempo de aparelhar forças armadas, regular as mídias sociais ou aprofundar-se no Poder Judiciário.


Ato contínuo, em 2018, Bolsonaro foi o maior atraso no processo de instauração da ditadura socialista no Brasil. Sem qualquer regulação, as redes sociais possibilitaram a eleição de um candidato que tinha apenas 7 (sete) segundos de TV e rádio. Antigamente, a TV e rádio seriam as únicas fontes para conhecer o candidato. Mas vejamos: o Youtube nasceu em 2005, o primeiro iPhone foi lançado em 2007 e o WhatsApp foi criado em 2009. Caso tudo tivesse ocorrido dez anos antes, Bolsonaro seria apenas um Enéas da vida e a esquerda certamente se perpetuaria nos anos seguintes, evoluindo ainda mais nos itens listados acima.


Mesmo assim, a mídia tradicional escancarou seu aparelhamento, dando voz a todo tipo de absurdo para desmerecer qualquer medida positiva do governo Bolsonaro. O Brasil “despiorava” e toda manchete que pudesse atribuir algum sucesso era acompanhada de uma conjunção adversativa: “O desemprego cai, mas...”. Despudoradamente, em 2022, o enraizamento na mídia se tornou explícito quando circulou o vídeo no qual o editorial do jornal da maior emissora do país comemorava aos berros e abraços a vitória do candidato da esquerda.


Não bastasse a mídia, de maneira escancarada, o Poder Judiciário desequilibrou o processo eleitoral, com toda sorte de censura, podendo ser destacada a proibição de uso do vídeo no qual Marco Aurélio, ex-membro do STF e TSE, em que narra situação verdadeira sobre a não absolvição do candidato Lula, cujos processos foram anulados e deveriam ter sido julgados novamente, não fosse a idade do acusado.


Agora, o PT irá assumir em 01 de janeiro de 2023 com o Poder Judiciário e parte da mídia a seu favor. Aparentemente e por enquanto, com o Congresso contra. No aspecto geral, a população está sedenta por mais Estado, especialmente porque no campo das ideias as escolas e universidades estão tomadas por professores de esquerda, como verdadeiras indústrias de marxistas progressistas.


Além disso, a casa está arrumada. As empresas estatais dão lucro, a inflação controlada é invejada no resto do mundo, o desemprego está em queda, dentre outros indicativos positivos. Tudo está pronto para a esquerda inflacionar a moeda nos próximos anos, distribuindo dádivas a toda sorte de pessoa, empresa e ditador latino-americano. Dentro do programa da esquerda, a dependência do governo tende a aumentar. O campo está limpo para financiar e subsidiar os amigos do rei, nesse capitalismo de Estado com apetite socialista.


Nos próximos anos, ainda, serão nomeados pelo menos dois magistrados da Corte Constitucional e dezenas de outros cargos no alto comando do Judiciário. Veremos generais e o alto escalão do exército prontos para se aposentar. Com as manifestações recentes, a depender, o governo eleito terá apetite até mesmo para cassar alguns deles, de modo a acelerar o processo de aparelhamento com a nomeação de novos generais de acordo com a pauta. A mídia já canta a pedra marxista-progressista em sua maior parte. Meios de comunicação como Jovem Pan e Brasil Paralelo já foram alvos do Judiciário. Agora, eventual regulação de canais independentes necessitará de leis, salvo se o Judiciário dobrar sua aposta ao argumento de defesa contra os “atos antidemocráticos” e as “fake news”. Resta ao Legislativo assegurar a liberdade de que precisamos.


Por fim, cabe à parte do povo que ainda valoriza a liberdade se manter como canal de defesa das ideias da liberdade e da propriedade privada, com o objetivo de retardar a contaminação das ideologias nocivas, pelo menos até que o próximo ciclo antissocialismo retome as rédeas do país, afastando o risco das desastrosas medidas econômicas e antiliberdade.


O momento é de regaçar as mangas e impedir o aparelhamento do Estado, para que possamos ainda ter voz quando a crise se instaurar. Afinal, como disse John Philpot Curran em 1808, "é o destino comum do indolente ver seus direitos se tornarem presa de quem é ativo. A condição sob a qual Deus deu liberdade ao homem é a eterna vigilância; condição que, se ele descumpre, a servidão é, ao mesmo tempo, a consequência de seu crime e a punição de sua culpa". Em resumo, o preço da liberdade é a eterna vigilância.



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